Montadoras querem mais prazo para regra ambiental

 

Setor alega perda de receita com covid para adiar investimentos

Por Marli Olmos — Valor Econômico  06/08/2020

Os representantes da indústria automobilística estão em contato com os ministérios do Meio Ambiente, Casa Civil e Economia para pedir o adiamento, de dois a três anos, da entrada em vigor das próximas legislações de emissões de poluentes e de equipamentos de segurança em carros, caminhões e ônibus. O argumento do setor é que a pandemia esvaziou os caixas das empresas, que se viram forçadas a adiar investimentos, inclusive nessas novas tecnologias.
Dirigentes da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) organizaram ontem uma apresentação para jornalistas que reproduziu, segundo disseram, informações que têm sido levadas ao governo e que serão analisadas também pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Até agora, segundo eles, o governo não deu resposta.
A agenda do Conama estabelece que as próximas fases, que restringem a emissão de poluentes e acrescentam equipamentos de segurança nos veículos, entrarão em vigor em 2022 para automóveis e comerciais leves e em 2023 para caminhões e ônibus. A proposta dos fabricantes é prorrogar a entrada em vigor das novas leis para 2025. Além da questão financeira, eles alegam que a paralisação das fábricas e a transferência do trabalho presencial para o home office afetaram a atividade da engenharia e os testes.
“Não podemos desconsiderar que a pandemia afetou a produção, o trabalho nos laboratórios de testes e fez 30% a 40% da nossa receita sumir”, disse o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes.
Segundo ele, a indústria automobilística havia reservado R$ 12 bilhões para investir em novas tecnologias de emissões e segurança veicular. Mas, agora, disse, a pandemia obriga as empresas a segurar investimentos. “A questão ambiental é, sim, nossa preocupação. Mas acreditamos que uma postergação no prazo de dois a três anos é razoável para o momento que estamos vivendo”.
No caso dos caminhões e ônibus, a atual legislação de emissões entrou em vigor em 2012. Trata-se do chamado Proconve P7, a versão brasileira do europeu Euro 5. Uma série de discussões polêmicas adiou o anúncio da etapa seguinte, o P8 (Euro 6). No fim de 2018, o governo federal determinou que a próxima fase entraria em vigor em janeiro de 2022 para novos modelos e a partir de janeiro de 2023 para todos os comerciais pesados.
A legislação em vigor para carros e comerciais leves é de 2014. Também em 2018 foi anunciada que a próxima etapa, chamada de L7, entrará em vigor em janeiro de 2022, e a seguinte (L8), em 2025.
Moraes lembrou, ainda, que “somos um país pobre” e que a situação fiscal brasileira é totalmente diferente da Europa, onde alguns governos oferecem bônus de € 6 mil ou mais ao consumidor que compra um carro elétrico, por exemplo.
Na apresentação, os dirigentes da Anfavea apontaram os veículos velhos como os maiores responsáveis pela poluição no transporte. “O ecossistema saudável não depende apenas dos veículos novos”, afirmou Moraes. Para ele, a solução está em ações do governo para criar programas de inspeção veicular e de renovação da frota.
Resoluções do Conama de três décadas atrás, destaca a equipe da Anfavea, já determinavam a criação de programas de inspeção dos veículos em uso. São práticas consolidadas em países europeus, mas que no Brasil ainda não passaram de frustradas iniciativas de alguns governos municipais.
A renovação da frota é uma discussão iniciada há décadas. Mas nenhum governo no Brasil arriscou, até hoje, tomar medidas impopulares, como sobretaxar carros mais velhos. Isso vale também para tributos estaduais. Veículos com mais de 15 anos são isentos de IPVA em vários Estados. Em alguns, como São Paulo, Paraná, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul, a isenção vale para automóveis que rodam há mais de duas décadas.
O que é de responsabilidade da indústria tem sido cumprido”, disse Henry Joseph Jr., diretor técnico da Anfavea. Segundo ele, desde 1986, data da primeira resolução do Conama, o nível de emissão de dióxido de carbono nos automóveis novos, por exemplo, foi reduzido em 95%. “Nossa preocupação não é decorrente de uma obrigação legal”, destacou Joseph Jr.
Em relação ao perigo de veículos velhos e sem manutenção nas ruas, o caso dos caminhões é o mais grave. Segundo estudo do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes (Sindipeças), 27% dos veículos de carga que rodam pelo país têm mais de 16 anos. E, embora previsto até no Código de Trânsito Brasileiro, em geral, o cuidado com a manutenção desses veículos depende, quase sempre, da boa vontade do proprietário.