A sina das marcas chinesas

No Brasil já houve experiências com veículos baratos vindos da Rússia

por FERNANDO CALMON

A tradicional discrição dos orientais pouco mudou quando se trata de anunciar os planos de marcas chinesas no Brasil. O caminho é o mesmo traçado por outros fabricantes – orientais e mesmo ocidentais – que preferiram chegar com cautela e se associando a grupos nacionais, em um primeiro momento. A Abeiva (Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores), que congrega marcas que não produzem localmente, já tem duas sócias sino-brasileiras – Districar/Chana e Effa/Change-Hafei – e anuncia para breve a associação da CNA Auto/Harbin-Shenyang-Brilliance-Jinbei.

A indústria chinesa caracteriza-se, por enquanto, por um emaranhado de marcas e participações cruzadas, envolvendo inclusive os governos central e provinciais. Sem contar as associações com marcas estrangeiras consolidadas – Fiat e Renault são as únicas que não possuem acordos de produção lá. É comum comparar as trajetórias de japoneses e coreanos com a nova onda que se forma no oriente. Afinal, se os japoneses gastaram 40 anos para chegar onde estão agora e os coreanos, 30 anos, por que duvidar de que os chineses não o farão em 20 anos?

De fato hoje a indústria de mundial de peças e componentes está mais livre e solta para vender para quem quiser. Estúdios de desenho independentes podem ser contratados em qualquer tempo. O monovolume Jinbei Topic para 13 passageiros, por exemplo, que começa a ser vendido aqui, tem estilo Pininfarina, mas ao gosto chinês. O resultado estético é bastante discutível, apesar do preço atraente. No entanto, tecnologia sensível dificilmente será repassada. Um custo alto que deverão enfrentar no futuro.
Martin Mitteldord, da consultoria brasileira White Mountain, afirma que ainda falta muito para os chineses em termos de foco no negócio, capacidade de gestão e, acima de tudo, cultura de qualidade.

“Quando esse cenário melhorar, será a vez de assumir os desafios de mão-de-obra e questões ambientais que vão pesar bem mais do que hoje no preço final”, acrescenta. Ele também é cético quanto à produção de veículos chineses no Brasil: “Terão de competir sofrendo com os altos custos de peças, insumos e leis trabalhistas nacionais. Precisam avançar bastante, até se transformarem em ameaça”.

As condições de uso aqui são tão ou mais severas do que na China. Há necessidade também de desenvolver motores flex, se desejarem competir em um cenário em que perto de 90% das vendas está centrada nessa oferta. Poderão se aproveitar de uma regra pouco conhecida fora da indústria: para produzir no país, hoje, só é necessário respeitar os 60% de conteúdo local nos modelos exportados para o Mercosul. Mesmo se optarem por operações de simples montagem de conjuntos importados, a cotação cambial e a distância que encarece o frete são obstáculos fortes.

No Brasil já passamos por experiências com veículos baratos e de qualidade proporcional ao preço, importados da Rússia. O mercado e as exigências evoluíram. Mas sempre haverá compradores e, quem sabe, arrependimentos tardios. Salvo se o governo exigir, ao menos, testes homologatórios de segurança. Aí a história pode mudar. É esperar para ver.

Fonte: Interpress Motor